A influência decisiva de Richard Wright

Autor

Leo Gilson Ribeiro

Resumo
Jornal da Tarde, 1992. Aguardando revisão.

Richard Wright (1908-1960) consegue desagradar quase que de maneira unânime. Extraordinário escritor negro do Sul dos Estados Unidos, momentaneamente cativado pelo Partido Comunista e logo expulso dessa associação que lhe pareceu limitá-lo como uma camisa-de-força, seu talento passional e franco até as últimas consequências o levou a abandonar o país em que nasceu e cresceu para abrigar-se junto aos existencialistas franceses, Sartre e Simone de Beauvoir, em Paris.

Este resumo da sua meteórica carreira sintetiza também os ferozes inimigos que foi fazendo à medida que seus livros atingiam leitores e metas, um público e uma ambição literária cada vez mais inesperados. Ter sido selecionado e censurado em parte pelo Clube Mensal do Livro que mutilou livros fundamentais como Native Son e Black Boy, mas os editores brancos eram de opinião que sabiam mais que ninguém o que seus associados brancos estavam dispostos suportar, partindo de um talento negro, vulcânico como Dostoievsky, em sua análise dos crimes e castigos reservados aos discriminados na sociedade norte-americana. Sua franqueza e mordacidade com relação aos escritores negros nos Estados Unidos alienaram os que hesitavam em aceitar juízos categóricos como, por exemplo, o de que os autores negros de seu país até então tinham se limitado a escrever literatura sem valor, buscando a esmola do reconhecimento da maioria branca: “Na maioria dos casos, esses embaixadores artísticos foram recebidos como se fossem cachorrinhos poodles capazes de mil acrobacias mirabolantes e engraçadinhas”. E que desleixado era Richard Wright!, reclamavam os que celeremente se dispunham a “corrigir” sua pontuação, sua “verbosidade”, sem compreender que ele usava técnicas de Joyce ao escrever sua literatura incandescente.

Agora, dois volumes que, juntos, ultrapassam mais de 1.500 páginas, englobam desde Lawd Today!, Uncle Tom’s Children até Black Boy e Outsider, numa publicação monumental da The Library of America (New York; edited by Arnold Rampersad). O lúcido crítico Alfred Kazin no The New York Times Book Review agita as páginas tantas vezes sonolentas desse suplemento literário colocando a revolução que esse escritor sulista trouxe para a literatura norte-americana, ou seja, um romancista que provém justamente daquela que é a mais rica região literária dos Estados Unidos, com gigantes como Faulkner e Mark Twain, entre outros. Kazin demonstra até que ponto foi fatal para Wright o exílio europeu. Por mais paradoxal que pareça, uma vez afastado do centro de sua inspiração incendiária o racismo que denunciou com um vigor e um sarcasmo talvez sem igual, Richard Wright cairia de qualidade artística, como sucedeu tragicamente com James Baldwin. Richard Wright ateou fogo a toda uma geração, inflamado pela crença de H. L. Mencken, o crítico que atribuía um poder cataclísmico “às palavras (usadas) como armas”.

Seus livros não trouxeram a revolução que ele esperava? O racismo continua vivíssimo nos Estados Unidos? Richard Wright não fez diferença alguma, então? A distância do tempo decorrido comprova que, até o limite imposto à literatura que não for meramente panfletária, seus livros possivelmente estão por detrás de Martin Luther King e da revolta estudantil de Little Rock. Ao contrário de Alfred Kazin, numa perspectiva mais abrangente, ser a ignição de todos os movimentos reivindicatórios nos Estados Unidos e logo na Négritude do antilhano Aimé Césaire ao senegalês Senghor. Sem dúvida, há falhas em determinados trechos grandiloquentes do estilo de Wright, mas hoje é mais fácil compreender como James Baldwin errou ao julgá-lo o autor de um livro “tão simplório” quanto A Cabana do Pai Tomás. Nem Native Son é ingênuo nem Uncle Tom’s Cabin pode ser considerado “simplório”. Se Invisible Man de Ralph Ellison, é mais perfeito, Native Son é uma primeira semente fecunda, lançada na década de 30, numa literatura que a partir daí não é, realmente, a mesma de antes.

Reuso

Citação

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Por favor, cite este trabalho como:
Gilson Ribeiro, Leo. (1992) 2022. “A influência decisiva de Richard Wright .” In Racismo e literatura negra, edited by Fernando Rey Puente. Vol. 1. Textos Reunidos de Leo Gilson Ribeiro. https://doi.org/10.5281/zenodo.8368806.